Diante da maior dor- a maior compaixão

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Por Profª. Isabel Orestes

Escrevo em maio, mês que no Brasil se convencionou comemorar “O Dias das mães”. As notícias divulgadas em diferentes mídias, informam como está aquecido o comércio por conta do apelo que essa data evoca. Afinal, mãe é no imaginário cultural, um símbolo arquetípico de segurança e de amor incondicional. A publicidade explora, através das imagens de abraços e troca de carinho entre mãe e filho, o conceito de proteção e a necessidade de se retribuir todo o cuidado maternal por meio de presentes. Vale todo gesto: a presença do filho, o abraço e o beijo, tudo é motivo de festa, sorriso e alegria para uma das datas mais significativas do calendário. Afinal, o amor e apoio se personificam na imagem da mãe.

O impulso afetivo que a comemoração explora se turva diante das tragédias e das violências que mães cometem: Gael de Freitas Nunes, de três anos foi assassinado por sua mãe no apartamento onde morava em São Paulo nesta madrugada do dia 11 de maio de 2021. Um mês antes, a tragédia aconteceu no Rio de Janeiro com a morte de Henry Borel, uma criança de quatro anos, morto pelo padrasto. Nesse segundo caso, a mãe se tornou cúmplice da barbárie.  Em ambos os casos, eram crianças pequenas que deveriam ser cuidadas, carregadas no afago do colo.

São muitos os filhos sem mães, violentados pelo sofrimento e descaso, mas graças a Deus, por tantas outras mães como a Déa Lúcia do Amaral – mãe que no dia 04 de maio, chorou a morte do filho tão amado, em decorrência do agravamento provocado pelo Covid-19. Milhares de outras mães anônimas, também choraram por seus filhos perdidos pela pandemia. 

Em vários depoimentos o ator Paulo Gustavo (1978-2021) comentou como sua mãe Déa, havia influenciado sua vida, inspirando inclusive a personagem Dona Hermínia, que o transformou em sucesso nacional com o espetáculo “Minha mãe é uma peça: o filme”.

No teatro, cinema e televisão, Paulo Gustavo se tornou referência de humor, estimulando o “riso como ato de resistência”. Fora dos palcos, demostrou ser dotado de um viver amoroso com os familiares, amigos e por extensão, com os desconhecidos que necessitavam de alguma ajuda humana. No anonimato contribuía com causas sociais diversas.  

No ato de seu falecimento, sua mãe segurava-lhe a mão. Junto com os familiares cantou a canção que ele conhecia e pedia para ser cantada desde a infância: “A oração de São Francisco”.

Senhor, fazei-me instrumento da vossa paz
Onde houver ódio, que eu leve o amor
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão
Onde houver discórdia, que eu leve a união
Onde houver dúvida, que eu leve a fé

Onde houver erro, que eu leve a verdade
Onde houver desespero, que eu leve a esperança
Onde houver tristeza, que eu leve alegria
Onde houver trevas, que eu leve a luz

Ó mestre, fazei que eu procure mais
Consolar que ser consolado
Compreender que ser compreendido
Amar que ser amado
Pois, é dando que se recebe
É perdoando que se é perdoado
E é morrendo que se vive
Para a vida eterna

Ó mestre, fazei que eu procure mais
Consolar que ser consolado
Compreender que ser compreendido
Amar que ser amado
Pois, é dando que se recebe
É perdoando que se é perdoado
E é morrendo que se vive
Para a vida eterna[1]

Dilacerada pela dor diante da morte, Déa – mulher sujeita as fraquezas como todas as mães do mundo-, suportou com fé a despedida do filho. Déa nos toca, na medida em que demostrou ser uma mãe, como tantas outras, que educam seus filhos para viverem suas vidas, baseando-se na ética de um comportamento altruísta e generoso.

Se, todavia, há fé, há esperança de ser encontrado(a) por Cristo e, ser consolado(a) por Ele.

Essa é a recompensa da fé, sentir-se acolhido(a) por Jesus à semelhança da mãe descrita no Evangelho de Lucas (Capítulo 7,11-17).  Trata-se de uma mulher viúva que vivia em Naim, um simples vilarejo. O seu único filho havia morrido e  Jesus encontrou a procissão que levava o corpo e “moveu-se de íntima compaixão por ela” (Lucas 7,13). Jesus sentiu profundamente a dor daquela mãe e identificou-se com sua angústia e sofrimento. A mãe nada pede, é de Jesus a iniciativa de ir ao encontro dela e oferecer-lhe consolo.

No verso 14 Jesus age, interrompe o cortejo, toca o corpo e faz algo inusitado. Ele tem o poder para comunicar vida. Fez um milagre e restaurou o filho à sua mãe.

Diante dos sofrimentos e das dores que enfrentamos, temos o Maior Consolador – Jesus, capaz de enxugar de nossos olhos toda lagrima e de transformar nosso pranto em riso. Em sua ação consoladora, Deus enche o nosso coração enlutado de esperança.  Ele nos concede graça para suportar as aflições e os embates da vida. Ele faz forte ao cansado, renova as forças do que já não têm vigor. Ele é um Deus presente por isso, diz: “Nunca o deixarei, nunca o abandonarei”. (Hebreus 13,5).

“Meu Deus, me dê coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites […]. Faça com que eu seja a Tua amante humilde, entrelaçada a Ti em êxtase. Faça com que eu possa falar com este vazio tremendo e receber como resposta o amor materno que nutre e embala […]”. (LISPECTOR, 1999, p.151)[2].

Não há vida sem lágrimas, mas ao lado do que chora, há um Deus de toda consolação. 


[1] Oração de São Francisco: Disponível em: https://formacao.cancaonova.com/igreja/santos/oracao-de-sao-francisco/. Acesso em: 11/05/2021.

[2] LISPECTOR, Clarice. Um sopro de vida (Pulsações). Rio de Janeiro. Rocco, 1999.

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